Prioridade para quem cuida: as chaves, o sorteio e as mães de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA)
A nova lei, proposta pela vereadora Lenita Afonso (foto) e aprovada pela Câmara de Vereadores, garante reserva mínima e prioridade nos programas habitacionais públicos para famílias com pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).

Por Ailton Silva Jornalista 20/09/2025 - 18h48min - 1 min de leitura
Na noite de terça-feira, 19 de agosto, o plenário da Câmara Municipal de Ariranha tinha um clima incomum. Entre papéis, celulares e olhares atentos, a vereadora Lenita Afonso (MDB) aguardava ansiosa a aprovação do projeto que, no papel, parecia apenas mais uma pauta legislativa. Mas não era. Era um gesto direcionado a um grupo de mulheres que, até então, permanecia invisível no desenho das políticas públicas: as mães de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA).
A leitura do texto coube à primeira-secretária, Isabel Abreu (PL), que, com voz pausada, anunciou: “Projeto de Lei nº 043/2025 – Prioriza Mães de Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) nos Programas Habitacionais Públicos do Município de Ariranha.” A proposta nasceu de conversas com famílias e técnicos de saúde e mirava diretamente a construção de novas moradias pelo município. “Não é só tijolo e cimento”, disse Lenita mais tarde. “É sobre garantir estabilidade para quem cuida.”
O que a lei garante
O plenário aprovou por unanimidade. Entre outros pontos, a lei reserva, no mínimo, 10% das unidades habitacionais para famílias com pessoa diagnosticada com TEA — nos termos do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015). Mais do que um número, trata-se de um recorte de realidade: mães e responsáveis legais, muitas vezes em condição de vulnerabilidade socioeconômica, passam a ter prioridade no sorteio público. O texto faz questão de frisar que a nova prioridade não exclui outras já previstas em lei e que a ordem de vulnerabilidade social deve ser respeitada.
Quem tem direito e como comprovar
O projeto define de forma precisa quem são os beneficiários: pessoas diagnosticadas conforme critérios da Lei Federal nº 12.764/2012; mães ou responsáveis legais que detenham guarda, tutela ou curatela; e programas habitacionais públicos promovidos pelo município ou com recursos da União, do Estado ou de entidades privadas. Também detalha os documentos exigidos: laudo médico com CID F84 (TEA); documento oficial do responsável legal (RG/CPF); comprovação de residência conjunta; certidão de nascimento ou documento que comprove maternidade ou tutela.
Mais do que moradia: acessibilidade e sensibilidade
Um parágrafo discreto delega ao Poder Executivo a regulamentação da lei e a definição de critérios técnicos complementares para aplicar a reserva e a prioridade. E vai além: recomenda que as unidades destinadas a essas famílias atendam critérios de acessibilidade, conforto sensorial e localização próxima a escolas e unidades de saúde, “sempre que possível”. Para especialistas, o detalhe sinaliza a incorporação de debates recentes sobre urbanismo inclusivo.
O manifesto da vereadora
A justificativa, escrita pela própria Lenita, é quase um manifesto. Ela defende que garantir moradia digna às mães de crianças com TEA é essencial para dar continuidade aos tratamentos e manter a convivência familiar. Amparada nas leis federais que reconhecem o autismo como deficiência e garantem prioridade em programas públicos de habitação, a vereadora diz que a iniciativa municipal “busca assegurar efetividade ao princípio da dignidade da pessoa humana e à proteção integral da criança e do adolescente.”
Num trecho que chama atenção, afirma: “A previsão de reserva e prioridade no sorteio é medida de justiça social, que reconhece o esforço das mães cuidadoras em condições de vulnerabilidade, e se alinha às diretrizes de inclusão e equidade previstas nas políticas públicas nacionais.” Na sessão, agradeceu aos colegas pela aprovação unânime e ao prefeito Dedê Trovó (PL) “pelo total apoio em todas as suas iniciativas no Legislativo.”
Do plenário para a vida real
Para quem acompanha os bastidores, a aprovação unânime é rara — um sinal de consenso em meio às frequentes disputas partidárias da Casa de Leis. Para as famílias, representa uma esperança concreta. Quando o município for construir novas moradias, pelo menos algumas delas estarão reservadas a famílias com pessoas com TEA. E, se a regulamentação seguir o espírito da lei, essas unidades terão portas mais largas, quartos mais silenciosos e acesso facilitado a escolas e unidades de saúde.
Na saída do plenário, já noite alta, Lenita compartilhou com a reportagem do Jornal de Domingo, quase em confidência: “Não é apenas uma lei. É um passo para que essas mães possam respirar um pouco mais aliviadas.”
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